Nova Lei de Franquias será o fim de muitas controvérsias

Artigo: nova Lei de Franquias – será o fim de muitas controvérsias?

Franquias sem ciladas

A publicação, em dezembro de 2019, da Nova Lei de Franquias, sob o nº 13.966/2019, revogando a Lei 8.955/1994, trouxe alterações em determinados pontos que geravam controvérsias quanto aos Sistemas de Franquias, e resultavam em um enorme número de ações judiciais.

A nova legislação trouxe previsões mais claras sobre as informações que devem constar da Circular de Oferta de Franquias (COF) e do contrato de franquia, o que pode significar a ampliação da segurança tanto para o Franqueador como para os Franqueados. Destaca-se, dentre outros, a necessidade de melhor detalhamento do suporte e serviços prestados pelo Franqueador, e o detalhamento das regras de concorrência territorial entre unidades próprias e franqueadas.

Outro ponto que merece destaque é possibilidade de adoção de cláusula de arbitragem nos contratos de Franquias, o que também vinha a ser tema de muitas discussões judiciais.

Ainda para afastar incertezas desnecessárias, sedimentou o legislador no artigo 1º da nova lei, os entendimentos majoritários dos Tribunais, com a previsão de que o Sistema de Franquia não caracterizará relação de consumo entre o Franqueador e o Franqueado. Tal artigo indica ainda que o Sistema de Franquia não caracterizará vínculo empregatício.[1]

No que diz respeito à previsão de que não será caracterizado o vínculo empregatício, é necessária cautela. Verdade é que a Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) por ser norma de ordem pública, não poderá ser afastada quando presentes os requisitos para sua aplicação, inclusive nos termos do seu artigo 9º daquela legislação. [2] Assim, se a realidade do sistema de franquias possuir elementos que caracterizem vínculo empregatício entre Franqueador e Franqueado, dificilmente a previsão da Nova Lei de Franquias, ainda que expressa, será levada em consideração pela Justiça Trabalhista.

Outra controvérsia que se pode considerar sanada vem a ser a possibilidade de o Franqueador explorar marca sem possuir o registro definitivo da mesma junto ao INPI. Tal situação muitas vezes era contestada nos Tribunais no que se refere à possibilidade de um pedido de marca vir a ser franqueado, inclusive com pedidos de anulação de todo um Sistema de Franquia por ausência de registro definitivo.

A clareza da legislação atual traz mais segurança jurídica aos franqueadores em relação ao registro da marca. Isso porque, considerando que o registro definitivo de marca junto ao INPI pode demorar alguns anos, a nova lei, já em seu primeiro artigo, § 1º, indica de forma expressa que o franqueador pode ser titular ou requerente da marca.[3]

A nova Lei de Franquias ainda prevê, em vários de seus artigos, que no Sistema de Franquia será explorada a “Propriedade Intelectual”, não apenas a marca e a patente, como previa a legislação revogada. Isso significa ampliar o conceito de exploração também para o desenho industrial e para direitos autorais, o que não era expresso na legislação anterior, mas obviamente corresponde à realidade de muitos Sistemas de Franquias.

A nova legislação visa elucidar também a possibilidade de sublocação de imóvel do Franqueador pelo Franqueado por preço superior ao preço da locação contratada.

Tal discussão se baseia na vedação do artigo 21 da Lei de Inquilinato quanto à possibilidade de a sublocação ter preço superior ao da locação.[4] Não raro, nos Sistemas de Franquias, Franqueadores adotavam preços superiores na sublocação aos Franqueados, e constantemente isso se tornava uma discussão judicial. A previsão da legislação atual consolida o entendimento de que a legislação especial deve se sobrepor à Lei do Inquilinato na hipótese. Não obstante, a Nova Lei de Franquias dispõe que, para que a sublocação ocorra, tal possibilidade deve estar expressa e clara na Circular de Oferta de Franquias (COF) e no contrato de franquia, bem como o valor pago a maior pelo Franqueado na sublocação não pode implicar onerosidade excessiva.

Por fim, um tema que ainda foi considerado nebuloso para muitos com a Nova Legislação, vem a ser a possibilidade de empresas estatais adotarem sistemas de franquias, uma vez que houve o veto presidencial ao artigo 6º da legislação atual.

Em que pese o veto do artigo 6º da Nova Lei de Franquias, o qual previa a oferta pública para adoção de franquias por estatais, isso ocorreu, conforme indicado nas razões do veto presidencial, vez que o artigo em questão apontava para a observância da Lei Geral das Licitações e não para a observância da Lei das Estatais, aplicável à hipótese. Entretanto, tal veto não afasta a possibilidade de adoção de Sistemas de Franquias pelas Empresas Estatais, o que, inclusive, ficou expresso no artigo 1º, § 2º da Nova Lei de Franquias, e que já vem a ser amplamente realizado, por exemplo, pelos Correios e pela Caixa Econômica Federal. [5]  

Em linhas gerais, é possível dizer que a nova legislação busca trazer mais clareza e segurança jurídica aos Sistemas de Franquias, sanando omissões da legislação anterior, verificadas tanto nos tribunais quanto no ambiente negocial desde 1994. Espera-se a diminuição das ações judiciais versando sobre tais pontos controvertidos, os quais eram omissos na legislação anterior.


[1] Lei 13.966/2019. Art. 1º  Esta Lei disciplina o sistema de franquia empresarial, pelo qual um franqueador autoriza por meio de contrato um franqueado a usar marcas e outros objetos de propriedade intelectual, sempre associados ao direito de produção ou distribuição exclusiva ou não exclusiva de produtos ou serviços e também ao direito de uso de métodos e sistemas de implantação e administração de negócio ou sistema operacional desenvolvido ou detido pelo franqueador, mediante remuneração direta ou indireta, sem caracterizar relação de consumo ou vínculo empregatício em relação ao franqueado ou a seus empregados, ainda que durante o período de treinamento.

[2] CLT. Lei 5452/1943. Art. 9º. Serão nulos de pleno direito os atos praticados com o objetivo de desvirtuar, impedir ou fraudar a aplicação dos preceitos contidos na presente Consolidação.

[3] Lei 13.966/2019. Art. 1º, § 1º Para os fins da autorização referida no caput, o franqueador deve ser titular ou requerente de direitos sobre as marcas e outros objetos de propriedade intelectual negociados no âmbito do contrato de franquia, ou estar expressamente autorizado pelo titular.

[4] Lei 8.245/1991. Art. 21. O aluguel da sublocação não poderá exceder o da locação; nas habitações coletivas multifamiliares, a soma dos aluguéis não poderá ser superior ao dobro do valor da locação.

[5] Lei 13.966/2019. Art. 1º, § 2º. A franquia pode ser adotada por empresa privada, empresa estatal ou entidade sem fins lucrativos, independentemente do segmento em que desenvolva as atividades.

Isabella Barros

Nova Lei de Franquias: será o fim de muitas controvérsias?


Sócia do escritório Perez & Barros Sociedade de Advogados, com atuação no Rio de Janeiro e São Paulo, especialista em direito empresarial, com ampla experiência em estruturação de Sistemas de Franquias. Formada pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), com LL.M. em Direito Corporativo pelo Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais (IBMEC).


Agência VitalCom

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